Márcia Coutinho relembra trabalhos na dublagem e fala do amor em sua profissão

Natural de Petrópolis, a dubladora e cantora Márcia Coutinho começou sua carreira em 1992, realizando a dublagem cantada nos estúdios. Entre seus maiores sucessos está a personagem Garnet de “Steven Universo”, e em 2004, foi selecionada para dois papeis de destaque, sendo esses a Mulher Elástica da franquia “Os Incríveis” e a Fada Madrinha do “Shrek 2”, que foi o primeiro personagem que a deu a oportunidade de cantar e dublar no mesmo papel.

Mãe da também dubladora Paula Tryack, a família está há gerações na área da dublagem. Confira a entrevista!

Conte-nos um pouco sobre o seu início na carreira de dublagem?

Eu iniciei a minha carreira na dublagem como cantora em 1992, e com o bom tempo que fiquei cantando na dublagem acabei me apaixonando. Fui fazer teatro para poder fazer a dublagem falada também, e acabei me encontrando profissionalmente na profissão. Gosto muito do que faço e acho que a dublagem tem que ser feita com muito amor, e que a voz da gente tem que chegar com muita verdade para tocar o coração vocês.

Uma das suas personagens que marcou no universo dos super-heróis foi a Mulher Elástica da franquia “Os Incríveis”. O que você achou da Disney ter dado um destaque maior para ela no segundo filme?

A Mulher Elástica é um xodó na minha carreira. Através da dublagem eu recebi grandes presentes na minha vida, e ela foi um deles. Depois de 14 anos do primeiro, ver o segundo filme tão bem feito, tão bom de assistir, ela com destaque na ação foi maravilhoso. Eu só tenho a agradecer por ter a oportunidade de continuar com a personagem anos depois.

No mesmo ano de “Os Incríveis”, tivemos outro sucesso que foi a Fada Madrinha de “Shrek 2”. Como foi dar voz a essa vilã icônica?

Meu deus! A Fada Madrinha do “Shrek” é um outro xodó que eu tenho. Realmente, no ano de 2004 eu recebi esses dois presentes, que foi dublar a Mulher Elástica e a Fada Madrinha, que eu acho que dublei no mês de maio e a Mulher Elástica no mês de agosto. Foram dois testes que eu nem fazia ideia que iria passar, porque, como eu tinha pouco tempo dublando, deveria ter uns três anos no máximo fazendo a dublagem falada, e estava competindo com pessoas experientes, não tinha muita esperança de passar.

Fiquei muito feliz quando eu recebi o resultado da Fada Madrinha, foi o primeiro personagem que eu cantei e falei por ela, então, foi uma experiência inédita. Ela é uma vilã maravilhosa, acho que ela deixou uma marca muito grande em todo mundo que assistiu ao filme, porque ela é cínica, debochada, é uma mãezona paparicando aquele filho dela. Foi uma personagem deliciosa de se fazer, foi um grande desafio, e sou apaixonada por ela e por tudo que me deu de alegria.

Outro trabalho que ganhou bastante atenção dos fãs de stop-motion foi “Kubo e as Cordas Mágicas”, onde você foi a Macaca. Já havia trabalhado com esse estilo de animação antes?

Em relação ao “Kubo e as Cordas Mágicas”, eu acho que foi a primeira produção em stop-motion que fiz. Tenho um carinho muito grande por esse trabalho, foi uma dificuldade muito grande, porque é uma personagem que evolui e tem que ficar mexendo na voz e no sentimento de maneira progressiva. Foi um desafio maravilhoso e tive muita vontade de fazer tudo bem feito, depois quando fui assistir fiquei apaixonada pelo resultado do trabalho, não mudaria uma virgula do que foi feito. Fui muito bem dirigida pelo Manolo Rey, muito bem produzida. É um outro trabalho e presente pelo que sou apaixonada.

Uma produção que várias crianças amam atualmente é “Steven Universo”, onde seu personagem é a Garnet. Esse papel vem te marcando recentemente?

Vou ser repetitiva, mais a Garnet de “Steven Universo” é um outro grande presente! Ela representa o amor, e eu tenho uma coisa muito forte com o amor. Eu gosto de fazer o que eu sinto, e geralmente o amor está à frente disso tudo. Eu faço o meu trabalho assim, eu entro no estúdio com todo o amor para fazer o meu trabalho que eu amo de paixão. Você ter a oportunidade de colocar sua voz em uma personagem que representa o amor, e que te leva para mensagens tão maravilhosas e uma maneira de agir em que você tem que encaixar sua voz ali é motivo de muita gratidão. Além de tudo que a Garnet traz para a minha vida, além de realizar esse trabalho maravilhoso, o feedback que eu tenho dos fãs, e o amor e carinho que recebo através dessa personagem. É uma coisa muito emocionante, não sei quantas vezes ei já chorei por tanto carinho e amor, situações em que a Garnet salvou uma pessoa, as vezes uma frase que salva e que dá esperança… eu tenho algumas histórias assim. Hoje mesmo recebi um áudio de um amigo de uma amiga da minha filha que descobriu que era minha vizinha, e mandou um áudio tão lindo falando do meu trabalho em modo geral e do que ele sentia da Garnet. Eu tinha acabado de gravar um vídeo que me pediram, e eu toquei na letra de uma música que eu acho muito forte, e que vem uma reflexão, e eu fiquei muito emocionada gravando ela. Essa música, a quantidade de pessoas que ouviu e sentiu esperança, outros falando que essa mensagem havia salvo a vida deles. Na hora que eu estava gravando, senti que ela iria ecoar dessa maneira. Ela é muito especial pelo que ela leva para as pessoas, pelo que ela representa e pelo que trouxe para minha vida também.

Em algumas dublagens, você também utiliza o canto. Esse é um recurso considerado poderoso na profissão?

Eu acredito que você saber cantar seja um dom, você ser afinado, ter uma noção musical… é um dom que a pessoa tem ou não tem, e você vai aprimorando com aulas de canto, sabendo dos seus limites e como irá utilizar, porque o instrumento é orgânico. Tem que saber usar para tirar um bom som, saber se expressar, ter a beleza… a aula de canto é para isso. Eu comecei na dublagem cantando, e quando você dubla e canta, acaba fazendo muitos testes porque o cliente quer que a mesma pessoa que duble, cante as músicas da personagem. Quando o cliente faz essa exigência, os diretores só podem chamar quem sabe cantar, sendo um recurso poderoso nesse sentido de reduzir, sendo que só alguns dubladores poderão fazer o texto. A música sempre esteve presente na minha vida desde que me reconheço por gente. Eu não a vejo como uma coisa a mais, tanto é que eu entrei na dublagem pela música, mais, para quem dubla e canta é um recurso poderoso pela possibilidade de fazer alguns trabalhos que nem todos poderiam fazer.

Sucesso entre as crianças em idade pré-escolar, um de seus trabalhos foi a voz da mamãe na série “Peppa Pig”. Como é seu relacionamento com os fãs da série?

A mamãe Pig é uma fofa! Ela é toda feliz, tem paciência com o papai, ela é uma graça e as crianças gostam. Eu ajudo muito os pais, que as vezes o filho não está querendo dormir na hora certa, não quer comer determinado legume, e os amigos pedem: “Márcia, grava um áudio da mamãe Pig dizendo que a Peppa tem que dormir as 22h” ou que a Peppa come cenoura, aí eu falo. Quando tem uma criancinha que eu faço a voz e não acreditam. É uma delícia fazer um personagem que alcança esse público infantil.

É engraçado que alguns fãs de “Steven Universo”, na faixa etária de 12 anos, já falaram que é decepcionante saber que você faz a voz da Garnet e é a mesma da mamãe Pig, porque elas já passaram dessa fase. É engraçado isso, porque ficam falando que o desenho não tem nada a ver. É muito gosto e muito feliz.

Mãe da dubladora Paula Troyack, como foi passar essa paixão para sua filha?

A Paula me acompanha no estúdio desde muito pequena. Às vezes, eu passava o dia no estúdio e ela ficava lá sentada conversando com os outros dubladores. O meu irmão também é dublador, meu sobrinho Bernardo também é, ela cresceu praticamente dentro do estúdio com a gente, então acho que foi fácil para ela se apaixonar pela dublagem. Hoje ela dubla muito bem, é sensível e calma, então acho que foi fácil para ela se apaixonar e vendo a família toda ali trabalhando. Eu não tinha empregada, então pegava ela na escola e ficava lá no estúdio comigo. Ela tendo alma de artista foi fácil.

Deixe uma mensagem.

A mensagem que eu gostaria de deixar, é uma mensagem de amor. A gente tem que pensar mais em tudo que pretendemos fazer, no que vamos nos envolver, é fazer com amor. Fazemos para nos realizar, porém, estamos nos realizando e entregando para outra pessoa. Se você fosse essa outra pessoa, você gostaria de receber uma coisa muito boa, então se você faz qualquer coisa com amor, você está entregando uma coisa boa para aquela pessoa. Se uma pessoa faz um bolo com amor, ela faz muito bem feito, então quem for comer ou comprar aquele bolo, ficará muito satisfeito de recebe-lo.

Acho que tudo é assim na vida. Você tem que aprender a se realizar e ver o que gosta, e o que eu tenho dom para fazer. Quando eu consigo juntar as coisas, o gostar de fazer e a aptidão divina que recebi, porque todos nós temos dons, cada um tem o seu. Acabamos complementando o que o outro precisa receber, e não aprendeu, não tendo aquele dom, e quando gostamos do que fazemos, acabamos fazendo com amor. Se temos dom para o que gostamos de fazer, o resultado será muito bom, além de entregar um pouco do seu amor naquele produto.

Com relação a função social do nosso trabalho, a gente faz para nos mantermos, para nos realizar, escolhendo uma profissão para ganhar dinheiro e se realizar, porém, não é só isso, através da sua profissão, você também servirá ao próximo. Isso tem que está muito ajustado na gente, temos que pensar nessa verdade, vendo que entregando para o próximo, temos que ter algo com muita qualidade, pois seja o produto que for, é isso que você quer. Devemos nos colocar no lugar de outro, pensando que poderia ser você que estaria recebendo. Muito obrigada pela oportunidade, eu falo com muito carinho, muita gratidão. É muito bom gostarmos do que fazemos, nos realizarmos, colocarmos amor no que fazemos. Fazer esse amor chegar nas pessoas, a ponto de virmos aqui falar um pouquinho, porque de certa forma, a gente conseguiu chegar no coração.